31. um chá: edição falecidos
Após o chá das cinco dos vivos, apresento-vos agora a lista do chá com a eternidade, as escolhas daqueles que infelizmente já cá não estão, na edição dos falecidos.
A primeira escolha é para os geeks, nerds, o que quiserem chamar, da malta da área da psicologia. E não, não estou a falar de Freud. Honestamente, acho que até teria algum receio de tomar chá com o caríssimo Sigmund, pois provavelmente estaria o tempo todo a analisar os meus atos falhados que, infelizmente, não são poucos. Refiro-me a Michael Mahoney, para mim um dos melhores psicoterapeutas da história. A obra constructive psychotherapy é um dos livros da minha vida e já perdi a conta ao número de vezes que a li e reli. Mahoney inspira-me não só como profissional, mas como pessoa. Há uma esperança e motivação que trespassam das suas palavras para a vida real que me fazem querer sempre ser mais e melhor. Algo que me causa estranheza quando penso na forma como deixou este mundo. Tenho a certeza que uma tarde passada a conversar com Mahoney seria como ganhar o euromilhões.
Depois, não há como não escolher Martin Luther King Jr.. Desde que me lembro de ser uma pessoa pensante sempre me senti, simultaneamente, fascinada e aterrorizada pela segregação racista. Aterrorizada por aquilo que somos capazes de fazer uns aos outros, sem qualquer remorso ou peso na consciência, muitas vezes até crentes de que estamos certos e somos seres de valor moral superior. Ao mesmo tempo, fascinada pelo modo como, sem violência, os negros foram capazes de lutar pelos seus direitos e transmitiram a sua mensagem. É preciso ser-se muito nobre, grande, gigante para não recorrer às mesmas armas e optar pelo caminho da paz e amor perante o ódio e a violência. Adoraria conversar com Martin Luther King Jr. e ouvi-lo falar da sua jornada, dos seus valores e ideais. Claro que existem muitos outros como Nelson Mandela, por exemplo, mas não posso fazer mais batota, por isso opto por aquele que é a figura que, desde pequena, me inspira no que diz respeito à tolerância e a não fazer aos outros aquilo que não gostamos que nos façam a nós.
De seguida, duas mulheres da área da música que o mundo perdeu cedo demais e que tinham tanto de talento como de insegurança. É impressionante como podemos ser tão bons, mas se não acreditarmos nisso, nunca nos sentimos dessa forma, por mais que os outros nos veja desse modo. Falo de Janis Joplin e Amy Winehouse. São de duas gerações completamente diferentes, mas sempre as achei tão parecidas no que diz respeito à sua psique. Depois de ver o documentário Little Girl Blue e o Amy (ambos vivamente recomendados) só senti vontade de as abraçar e dizer "meninas, vocês são incríveis, não deixem que ninguém vos convença do contrário e vos faça sentir que são menos do que isso!". Por isso, eu adorava ter a oportunidade de me juntar com estas duas mulheres que tanto admiro e poder dizer-lhes abertamente o quão épicas e inesquecíveis são. Depois pedia para cantarem para mim claro: a Janis podia cantar-me a Maybe e a Little Girl Blue e a Amy poderia cantar a You Sent Me Flying e a Help Yourself. Agora que penso, quão incrível seria estas duas se conhecerem?
Ainda no universo musical, tenho mesmo de convocar o Jim Morrison para um chá. Para mim, as letras dos The Doors são poesia pura e eu adoraria conversar sobre isso com Jim. Adoraria ter a oportunidade de o conhecer, ele que foi uma figura tão carismática e única, embora ao mesmo tempo tão insegura, ao ponto de precisar de cantar de costas para não encarar o público. Seria uma tarde inesquecível, não tenho dúvidas.
Como convidados especiais, duas pessoas inspiradoras. A primeira, mais um nome da psicologia, o enorme Carl Rogers. Tornar-se pessoa é mais um dos livros que me marcou e transformou radicalmente a minha forma de estar na vida. A ideia de que estamos em constante processo de mudança, que estamos constantemente a tornar-nos, libertou-me de muitas crenças nada positivas. Rogers é luz, é esperança, é conforto, é aceitação, é acreditar que podemos tudo. Por algum motivo foi o criador da corrente humanista, aquela que vê o outro como ele é, que o aceita, que o acolhe e acredita profundamente no seu potencial.
A segunda, Tao Porchon-Lynch, a mais antiga professora de yoga, que faleceu recentemente, em 2020, mas que deixou um legado inspirador. Uma mulher pequenina e franzina que irradiava boa energia, sempre em movimento, confiante em si e na vida, que acordava todos os dias e dizia a si mesma "hoje vai ser o melhor dia da minha vida!". Como não querer estar na companhia de alguém assim? Acredito que uma tarde com Tao seria o equivalente a rejuvenescer muitos anos de vida.