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just keep swimming

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24
Ago21

27. confessions of a ghost

mar

Gostava de compreender o porquê de fazer tanta confusão às pessoas existirem pessoas com tom de pele branquinho. A sério, podem ajudar-me a perceber este fenómeno que tende a manifestar-se nos meses de verão? 

No meu caso, sou um copinho de leite ambulante, um fantasminha. A minha pele é muito sensível, chegando a fazer alergia quando exposta demasiado tempo ao sol, mesmo com a devida proteção. Como poderão imaginar, com estas condicionantes, o que mais evito é ficar com escaldões ou alergias. Tenho amor próprio suficiente para me resguardar, só apanhar sol nos horários mais suaves e proteger-me sempre com FP 50+. 

E convivo muito bem com a minha brancura. É como sou, a minha pele é delicada, não há nada a fazer a não ser cuidar dela e preserva-la para não ter complicações maiores. No entanto, esta aceitação parece não se alargar às pessoas que me rodeiam. Sei que, provavelmente, não fazem por mal, mas têm sempre a necessidade de comentar "então, foste de férias e ainda assim estás branquinha?" ou "meu deus, estás mesmo branca!". Costumo rir-me e responder que a minha branquidão não é mutável, não é um estado temporário. Não estou branca, sou branca! 

Eu também gosto de ver as pessoas morenas, acho que ficam lindas e o moreno esconde muitas imperfeições, além de que quase todas as cores assentam bem numa pele morena. Mas se essa condição não está ao meu alcance, porque não aceitar? Porquê a necessidade de comentar? Para mim, é um assunto pacífico, mas acredito que existirão pessoas que se sintam ofendidas ou conscienciosas perante esse tipo de comentários. Além de que, por norma, quando se fazem esses reparos, provavelmente as pessoas não pensam que a outra pessoa poderá ter algum problema de saúde que a impeça de estar exposta ao sol ou, simplesmente, não gosta de o fazer!

No meu caso, gosto muito de praia, mas como tenho de ter tantos cuidados, acabo por preferir fazer uma boa caminhada à beira-mar do que estar deitada na toalha a esturricar. Mas tenho amigos que não suportam praia nem a ideia de estar deitados ao sol o dia inteiro. Outros, por exemplo, com apenas uma tarde de sol ficam praticamente pretos. Somos todos diferentes e ainda bem que assim o é!

Por isso, por favor, deixem os branquinhos em paz, que nós não implicamos com o vosso moreno incrível! 

23
Ago21

25. assertividade

mar

Se há coisa que me irrita é a falta de tato, de sensibilidade. Incomoda-me o facto de as pessoas dizerem o que bem lhes apetece sem pensarem, primeiro, no modo como a sua mensagem vai ser recebida pelo outro. Sem terem o cuidado de prever se o modo ou o conteúdo não poderão ser mal interpretados, difíceis de digerir e até se valem ou não a pena.

Facilmente se cai no erro de achar que ser sincero ou honesto é uma virtude sem limites, confundindo-se muitas vezes sinceridade com brutalidade. Creio que se pode dizer tudo, mas é preciso saber como o fazer e, quando não se sabe, é preferível estudar primeiro a estratégia do que avançar sem rodeios.

Lembro-me de duas situações destas que aconteceram comigo. Uma delas foi um comentário simplesmente desnecessário, que não me afetou pelo seu conteúdo, mas que me fez pensar que a pessoa perdeu uma excelente oportunidade para ficar calada. Ter a necessidade de elogiar alguém comparando com outra pessoa, reduzindo essa em detrimento da outra, é, no mínimo, desnecessário e ridículo. Porque não elogiar alguém simplesmente pelas suas características? Por si? Sem ter de a comparar com outra? Creio que ambas ficam agradecidas.

Outra situação, essa sim, magoou-me pela falta de sensibilidade demonstrada. Uma conversa que mais se assemelhou a um monólogo (uma vez que a oportunidade de dialogar se tornou insustentável), onde a carta da honestidade prevaleceu como “vale tudo”. Mas não vale tudo. Fiquei magoada não pelo conteúdo, mas pelo modo como aquela pessoa teve a capacidade de me expor, de me fragilizar e tornar vulnerável pela forma como optou por introduzir e desenvolver o assunto. Só conseguia pensar, enquanto a ouvia, que só queria abrir um buraco no chão para me esconder. Haveria necessidade disso? Estou convicta que não, bastava a pessoa ter adotado uma outra abordagem e a conversa já seria totalmente diferente.

E isto acontece todos os dias, sobretudo se pensarmos nas redes sociais, que se tornaram um palco, um microfone para toda a gente impor as suas opiniões a qualquer custo, mesmo que isso signifique o bem-estar emocional de outra pessoa. Vivemos na era do vale tudo e isso é tremendamente assustador. 

Pessoalmente, quando não tenho nada de positivo para dizer, remeto-me ao silêncio. Se acredito que posso transmitir a minha mensagem sem ferir ou magoar, faço-o e procuro assegurar que fui bem interpretada. Tenho o cuidado de estudar muito bem como vou dizer determinada coisa, como vou contextualizar, como vou abordar o assunto. Se estou a navegar pela internet e me deparo com alguma coisa que não gosto, sigo o meu caminho, não perco tempo a destilar o meu desagrado. É tempo e energia que se perdem em vão. O mesmo acontece na vida real e física. Não invisto tempo em pessoas ou situação que não o merecem. 

Nos últimos tempos tenho refletido bastante acerca deste tema, porque tenho sentido vontade de responder a alguns comentários que ouço e não de forma tão simpática. E acho que neste tópico reside uma aprendizagem importante que está à espera que eu a adquira. É preciso ser-se assertivo na comunicação, seja como emissor como recetor. Muitas vezes não o ouço, fico-me pela passividade e ao fazê-lo, permito que o outro pense que pode dizer tudo que quiser, como bem entender. Se não estabelecemos os limites entre o aceitável e inaceitável, as pessoas consideram que tudo é válido, quando não o é. É aqui que preciso de investir a minha atenção, porque de certo modo, estou a contribuir para uma situação que não me agrada.

Nem sempre é fácil ser assertiva quando o faço em prol de mim mesma. Sei que não faz sentido, mas entre defender alguém e defender-me a mim mesma, a primeira opção é sempre a mais fácil, aquela que faço num abrir e piscar de olhos. Quando se trata de mim, tenho muita dificuldade em impor-me, em traçar as fronteiras e defender os meus interesses. Noto isto em pequenas coisas como, por exemplo, fazer um pedido de férias. É um direito que tenho, enquanto trabalhadora, mas sempre que peço um dia, sinto-me a morrer por dentro como se estivesse a pedir um favor à empresa. E com a necessidade de justificar, muitas vezes. Se alguém me responde mal, por exemplo, procuro amenizar a situação, em vez de dizer diretamente à pessoa que não são modos de falar com alguém. O meu quotidiano está cheio de exemplos onde me falta afirmação pessoal e a capacidade de me defender. Por um lado, sei que muita da minha passividade advém de não gostar de conflitos e estar sempre sintonizada na opção que assegura a maior tranquilidade possível. Não me importo de engolir um ou outro sapo se isso significar que as coisas se resolvem e todos ficam bem. Mas esta passividade também tem raízes mais profundas, assentes em crenças como "será que tenho o direito de me impor?", "será que tenho o direito de me chatear?", "será que não sou eu que estou a exagerar?". Existe sempre uma vozinha dentro de mim que me diz que não, que não tenho esse direito, que me inferioriza em comparação aos outros. Como se eu fosse menos e, como tal, não tenho o mesmo direito que os outros têm de expressar a sua insatisfação. 

E eu sei que nada disto é lógico, nada disto faz sentido e nada disto é real. Que é necessário contrariar este padrão que, de alguma forma, se formou e repete sempre nas interações sociais. É uma aprendizagem, é um processo, o que significa que não será do dia para a noite, não será rápido nem indolor. Mas em pequenos passos, consistentes, é preciso ir praticando e afirmar o meu valor. Fico orgulhosa quando sou capaz de me defender, com educação, com assertividade. Sinto uma descarga de adrenalina, não vou mentir, é algo estranho e que me deixa acelerada, mas no final, sinto sempre que vale a pena. E só lamento que as pessoas não façam este exercício de reflexão, pensando de que modo poderão estar a contribuir para situações da sua vida das quais não gostam. Porque há sempre uma quota parte que é da nossa responsabilidade, que podemos fazer de forma diferente e só assim poderão surgir resultados também diferentes. 

É a velha e sábia ideia de que só podemos mudar e controlar aquilo que pensamos, dizemos e fazemos. Tudo o resto é externo à nossa vontade e poder. Mas dentro de nós, aí sim, reside toda a nossa liberdade e potencial. 

20
Ago21

23. others

mar

Hoje, enquanto consolava um grande amigo naquela que é uma das maiores tristezas da vida, dei comigo a pensar no perigo que é, por vezes, vivermos para os outros. E este pensamento foi muito estranho porque eu sou tendenciosamente uma pessoa mais voltada para os outros do que para mim mesma. Sou mais de dar do que de receber, de cuidar do que ser cuidada. Por isso, é-me natural o papel de agradar os outros e colocar as suas necessidades acima das minhas, é fácil perder-me neste exercício de dar mais, às vezes tudo, aos outros do que a mim mesma.  

Mas por algum motivo hoje pareceu-me perigoso viver desta forma. Porque nos pode custar a nossa saúde, a nossa sanidade, o nosso sentido, a nossa identidade. Pode esgotar-nos, pode nunca ser suficiente e ficar somente um enorme vazio. 

Não me interpretem mal. Devem existir poucas alegrias tão simples e enriquecedoras como ajudar alguém, seja de que forma for. Não proponho que temos de ser todos uns egoístas e egocêntricos, apenas centrados no nosso umbigo e nas nossas vontades. O que reflito é no equilíbrio, por vezes difícil de alcançar, que é necessário entre os outros e nós mesmos. Nas fronteiras. Nos limites. Nos momentos em que nos priorizamos, em que cuidamos de nós, em que percebemos que não podemos colocar tudo e todos à nossa frente. 

O meu namorado diz-me muitas vezes que devemos sempre ser a pessoa mais importante da nossa vida. Depois de mim podem vir todas as outras pessoas, mas que eu preciso de estar em primeiro lugar. E se de princípio me parecia uma forma de estar na vida um pouco ou tanto egoísta, hoje compreendo na perfeição o que ele me tenta dizer. Não se trata de os outros não serem importantes e não nos preocuparmos com eles. Trata-se de nos colocarmos numa posição em que somos, pelo menos, igualmente importantes e que nos respeitamos e levamos a sério como levamos as necessidades dos outros. É saber quando dizer não, quando não fazer fretes, quando não esticar a corda mais do que aquilo que ela pode aguentar. 

Porque quando vivemos só para os outros ... não sei. Não é não que seja digno, que não seja de louvar, porque é. Mas corremos o risco de ficarmos sozinhos, com uma enorme sensação de vazio, de fracasso, de impotência, de nada. Um nada que se torna tão difícil de preencher quando nos habituamos a alimentar apenas e somente dos outros.

11
Ago21

19.

mar

A minha mãe preocupa-me. É a minha maior preocupação, aquela que faz com que todas as outras me pareçam pequenas e insignificantes. 

A minha mãe é, neste momento, o retrato e exemplo perfeito de alguém a quem a vida pregou uma rasteira, a fez cair e ainda não foi capaz de se reerguer. Continua ali, estendida no chão, às vezes tentando levantar-se, outras vezes simplesmente à espera que alguém lhe dê a mão e a puxe para cima. Mas mesmo quando alguém lhe estende a mão e investe todos os esforços para a erguer, ela não é capaz de a amarrar e aproveitar, tornando a tombar e a cair. 

A minha mãe está há tanto tempo no chão, que fez dele um lugar confortável. Está longe de o ser, mas é um lugar conhecido, familiar e que passou a ser suportável. Mudá-lo ou retirar-se dele já não parecem opções e, quando são, parecem improváveis, para não dizer impossíveis.

A minha mãe ainda é jovem, mas vive a vida de uma pessoa idosa. E creio que existirão pessoas de idade com uma vida mais dinâmica e preenchida do que ela. Olho para ela e o meu coração aperta-se de angústia. Uma dor fulminante, que me deixa à deriva, sem saber o que posso mais fazer. Uma culpa que surge de mansinho, mas que se faz notar, que me diz baixinho que não estou a fazer o suficiente. E, depois, uma revolta e fúria que ripostam e gritam "mas não é possível fazer mais, não é possível viver outra vida que não a nossa, não é possível ajudar quem deixou de acreditar!". 

A minha mãe merece o mundo, é daquelas pessoas boas, sempre pronta e disponível para ajudar. Ela é aquela que, tantas e tantas vezes, estende a mão a quem está no solo, sem saber como se regressa à tona. Já viveu tantas agruras e conseguiu sempre encontrar um caminho, uma maneira de reescrever a história. Mas desta vez vejo-a completamente perdida, desamparada e, aquilo que mais me assusta, inerte e conformada. Sinto que se entregou às mãos do desespero e da desesperança. 

A minha mãe preocupa-me. Sim, sei que já o disse, mas esta preocupação repete-se, transforma-se, aumenta. Não se extingue, não desaparece, não vai embora. Às vezes sinto que os papéis se inverteram e eu passei a ser a mãe que não dorme enquanto a filha não chega a casa, a mãe que sofre, que fica angustiada quando vê a filha sofrer, a mãe que, se pudesse, protegia a filha de todos os males do mundo. 

Começo a ficar sem ideias, sem soluções. Não sei o que dizer, o que fazer, o que mais é possível e está ao meu alcance. Enquanto escrevo estas palavras, estamos no mesmo espaço, eu à mesa, ela no sofá, perdida num filme romântico qualquer da Fox Life, daqueles em que tudo acaba sempre bem. E eu gosto de acreditar que a realidade imita a ficção e que tudo também acaba sempre bem. Mas não consigo evitar pensar, quando é chegará esse momento?

06
Ago21

13. estranged

mar

Às vezes, sinto-me anestesiada. Estou constantemente à espera do momento em que tornarei a ser eu mesma ou, pelo menos, quem costumava ser. Estou à espera de voltar a sentir tudo como antes, de me entregar de corpo e alma às emoções e não ter medo de as sentir. Hoje fujo delas, sobretudo das fortes e intensas. Antes não era assim. Não tinha medo de sentir, por mais desconfortável que fosse a situação, ali estava eu, recetiva e presente. Mas hoje sinto-me inquieta, incapaz e indefesa. 

Estou à espera de voltar a mim, mas, por vezes, questiono-me se alguma vez voltarei a encontrar essa pessoa. Será que tornarei a encontrar-me ou será que sou uma pessoa diferente? Será que continuo à procura e à espera de alguém que já não existe? Ou será que estou simplesmente adormecida, ainda a digerir tudo que tem acontecido, e que irei despertar a qualquer momento?

Estou a ler o "Tudo o que nunca fomos" de Alice Kellen e encontro tantas semelhanças entre mim e Leah, a protagonista. Não na situação em si, mas na forma como reagimos. A fuga à dor, o bloqueio de qualquer emoção, seja positiva ou negativa, a sensação de que há coisas que são demasiado difíceis, quase impossíveis, de serem digeridas. Mas tenho aprendido com Leah e o fascinante da leitura é mesmo este modo como as personagens nos acompanham muito além das páginas dos livros. Ficam connosco por muito tempo, surgem no pensamento a meio do dia e as suas experiências iluminam as nossas. A Leah tem me ensinado a sentir, a estar presente para as minhas emoções e dar-lhes espaço e tempo. A dor faz parte da experiência de viver e a Leah tem vindo a concluir, tal como eu, que não podemos usufruir da felicidade se não passarmos pelos escombros da dor.

Ainda assim, perco-me muitas vezes a pensar sobre o paradeiro da minha antiga pessoa. Tenho saudades minhas. Gosto muito da pessoa que sou, mesmo que, por vezes, me pareça uma estranha e não uma fiel amiga. Mas gosto de mim e tenho orgulho no modo como tenho conseguido levar o meu barco além de todas as tempestades e tormentas. No entanto, não consigo evitar sentir saudades daquela miúda leve, aberta, recetiva a tudo, que sentia e sabia que podia conquistar o mundo. Hoje carrego mais peso, as responsabilidades multiplicaram, herdei muitas coisas que não desejei. E se é bom saber que sou capaz de aguentar mais e com mais facilidade, também é muito bom ser leve e fluir com a vida, sem ter de estar a pensar em tudo a toda a hora. 

05
Ago21

12. I can't get no satisfaction

mar

Estou a fazer uma travessia no deserto no que diz respeito ao meu trabalho. Ando a passar por uma fase de enorme desmotivação, em que todos os dias, quando toca o despertador, sinto que acordo mais cansada do que quando me deitei. A ideia de ir trabalhar e passar o meu dia fechada num escritório fazem com que me sinta drenada de qualquer energia, como se um muro de betão tivesse sido erguido à minha frente, entre mim e a minha motivação, e fosse impossível de furar, quebrar ou atravessar.

Sempre fui uma pessoa de manhãs. Por norma, acordo bem-disposta, cheia de energia e com vontade de conquistar o mundo. Por isso, quando me deparo com estes níveis tão baixos de vontade logo às 7h da manhã, percebo que algo não está bem. Tendo a atribuir este cansaço todo ao facto de ainda não ter ido de férias, de as poucas férias que gozei até à data de hoje terem sido para me dedicar a outros afazeres e responsabilidades e, como tal, não serviram para descansar.

No entanto, dentro de mim, naquele cantinho onde costuma esconder-se a verdade, sei que não é apenas por esse motivo que me sinto assim. Porque não me sinto apenas cansada. Sinto-me aborrecida, desinteressada e completamente desinvestida. Sou uma pessoa que gosta de aprender coisas novas, estou sempre a desafiar-me e a aprender alguma coisa. Tenho sede e fome de conhecimento e, por isso, por mais que goste de dominar as tarefas que tenho à minha responsabilidade, também gosto de me dedicar ao processo de aprender outras tantas. Gosto de por os neurónios em ação e no meu atual trabalho isso não acontece, é extremamente rotineiro e monótono.

O ambiente de trabalho, com exceção de um grupo de pessoas de quem gosto muito e se tornaram amigas, também não é o melhor. Não que os meus colegas não sejam boas pessoas, mas o ambiente da empresa estimula o medo, o estado de alerta e, com isso, torna-se difícil um clima de paz. Assim, todos os dias, quando ponho o pé nas escadas de acesso ao meu gabinete, respiro fundo e penso "o que será que vou encontrar hoje?". Muitas vezes, aliás, quase sempre, os problemas que assisto são apenas isso, problemas dos quais sou observadora, mas não é por não ser na minha pele que não me arrepio na mesma. Nesta empresa o provérbio "nas costas dos outros vejo as minhas" tornou-se um lema e todos os dias o comprovo.

Além deste ambiente, assisto todos os dias a atitudes que espelham a falta de reconhecimento e valorização. Estou cansada de dizer que valorização não é apenas e somente o salário que se leva ao final do mês para casa. É sentir que o nosso trabalho é reconhecido, é obter feedback (tanto negativo como positivo), é ver a nossa vida além trabalho ser respeitada, é ser tratado com respeito e dignidade. Estou numa posição a que costumo chamar o lugar do morto, porque é aquele tipo de trabalho que é o chamado trabalho invisível. Dá muito trabalho, mas só se apercebe disso quando não aparece feito. Como tal, é frequente ver pessoas com menos responsabilidade ou menos tempo de casa, mas que são mais "choronas", a ter mais reconhecimento. E a parte que mais me impressiona nisto é que não me afeta. Não me tira o sono, não me agita o batimento cardíaco, não me deixa nem uma pontinha enraivecida. E isso não é normal em mim, que sinto tudo à flor da pele. Mas torna-se natural quando não estou investida, quando as coisas não me dizem nada e são distantes. É por isso que vejo diariamente vários tipos de injustiças, que me poderiam fazer sentir descontente ou zangada, mas não me alcançam. Não quero saber, estou nem aí (sim, remember para a Luca e o seu grande hit). Esta atitude, ou falta dela, mostra-me o quão desinteressada estou neste trabalho e empresa. Já não tenho sequer paciência, pachorra ou energia para me importar e ofender.

Apesar de tudo isto, sinto que continuo a fazer bem o meu trabalho, porque o faço por mim, pelo meu sentido de responsabilidade e pelo sentido de missão que coloco em tudo onde estou presente. Não o faço pelos meus patrões, não o faço para que me passem a mão pela cabeça ou me digam "bom trabalho", porque já aceitei há muito tempo que isso nunca acontecerá. Faço o meu melhor porque só assim me faz sentido. 

Sei que permaneço neste emprego por conforto e comodidade. Porque recebo bem, estou perto de casa, conquistei o meu lugar e tenho um grupo de amigas que fazem com que os dias cá dentro se tornem suportáveis. Mudar nesta altura do campeonato, num contexto pandémico, onde nada é seguro, não me parece viável nem sensato. Então vou aguentando, dia após dia, sempre com o olho nas 18h, nas sextas-feiras e nas férias. 

O que me entristece é que o tempo passa muito rápido e, num piscar de olhos, passaram 3 anos e eu cá continuo. Entrei nesta empresa uma menina e hoje vejo-me mais velha, madura, mais próxima dos 30 do que dos 20 e sinto que estou a desperdiçar a minha vida cá dentro. Estou a deitar fora o meu potencial, a contentar-me com algo que não me realiza nem faz feliz pelo conforto de ter um salário gordinho. Questiono-me muitas vezes se valerá a pena abdicar de tanto por esse conforto. Mas depois rapidamente me abano e digo a mim mesma que este trabalho é uma bênção, que deveria focar-me mais nos aspetos positivos, que deveria sentir-me grata e que na vida não podemos ter tudo. Tenho este diálogo comigo mesma diversas vezes ao dia e há dias em que tudo flui e me é fácil acalmar esta tempestade interna. Mas depois existem outros, que me fazem confrontar com esta insatisfação e me mostram a minha falta de audácia e coragem para mudar algo que não está bem. Chega a ser esquizofrénico o jogo de pensamentos contraditórios a que me entrego para conseguir aguentar mais um pouco. 

O meu caso não é único, antes fosse. Sei que, tal como eu, muitas pessoas se levantam todos os dias para irem para um emprego que não é o seu sonho, que há empregos muito piores do que o meu, que existem pessoas que dariam tudo para terem um emprego. Mas, perdoem-me, isso não minimiza a sensação de estar a ver a vida passar diante dos nossos olhos e pensar que este cenário não tem nenhuma semelhança com aquele que idealizamos para nós mesmos. E não me interpretem mal: eu nunca fantasiei com nenhum emprego em particular ou um determinado estilo de vida. Nos diversos planos que fiz para mim, nas mil e quinhentas ideias que tracei, existia apenas uma variável constante: eu sentia-me realizada e feliz. Uma felicidade que não é aquela felicidade absurda, de sentir que todas as células se desfazem em sorrisos e que tenho um fogo de artifício prestes a explodir dentro de mim. Em vez disso, uma felicidade serena, de alguém que acorda todos os dias com uma missão, um propósito, que passa os dias a realizar-se e que pode chegar ao final de uma jornada de trabalho e sentir-se bem consigo mesma. 

Cada vez mais olho para o tempo como a relíquia mais valiosa que possuímos. Nada substitui o tempo, nada o compra, nada tem mais valor. Confrontar-me com a realidade de que desperdiço o meu tempo, que é tão frágil, veloz e precioso, num lugar que não me acrescenta, que não me realiza, que me cansa, drena e satura, é difícil. Sinto que estou a deixar a vida fugir-me pelas mãos. Observo este cenário e estou paralisada, a deixar que aconteça, sem fazer nada para o inverter. 

Provavelmente esta é apenas mais uma fase, no meio de tantas outras. Pode ser o retrato perfeito de alguém que precisa urgentemente de ir de férias. Ou pode ser tudo isso mais a consciência plena de que está na hora de agir, de me mexer e fazer à vida. Não sei. Talvez daqui a duas semanas a tempestade tenha passado e venha a bonança. Talvez venha a acalmia, a serenidade ou a certeza, a confiança, a coragem. Uma coisa é certa: tanto ficar como ir são decisões. São escolhas, têm consequências, têm implicações. E não escolher é, em si mesmo, uma escolha. 

02
Ago21

9. self care

mar

Nos dias de hoje ouvimos falar constantemente sobre autocuidado e como este é importante para preservar a nossa saúde, desde a física à mental. Fico feliz por este ser um tema que chega a cada vez mais pessoas, sobretudo numa era em que, mais do que nunca, precisamos de parar, respirar e saborear aquilo que a vida tem de melhor e de mais simples. A pandemia fez com que a saúde mental se tornasse num assunto de destaque, embora muito pouco ainda tenha sido feito no sentido da prevenção e todos os esforços se concentrem mais na farmacologia do que noutro tipo de terapias e formas de estar e viver. 

Cada vez mais pratico o autocuidado no meu quotidiano. Não passo um dia sem dedicar, pelo menos, cinco minutos a algo que seja para o meu bem-estar e me faça sentir bem. E isto pode ser altamente diverso e, por norma, varia todos os dias. Pode ser ouvir música ou um podcast, dançar, fazer uma caminhada ou uma sessão de exercício físico em casa, fazer uma videochamada com amigos, ler, namorar, ver um episódio de uma série, meditar, tomar um chá à janela, fazer uma máscara facial, experimentar um penteado novo, etc e etc. Há tantas e tantas atividades que promovem a sensação de serenidade, de prazer e bem-estar, e que estão facilmente ao nosso alcance. Não é preciso uma enorme ginástica de tempo, basta termos presente que o nosso bem-estar deverá ser uma prioridade e que em 24horas é sempre possível arranjar um bocadinho de tempo para cuidarmos de nós. 

Ontem o dia foi dedicado ao meu autocuidado. Sabia que ia estar sozinha em casa a maior parte do dia e aproveitei cada segundo. Descansei, fiz o meu almoço, vi a nossa incrível Patrícia Mamona alcançar o 2ª lugar, li um livro do início ao fim enquanto me enroscava numa manta no sofá. Bebi o meu chá, ouvi a chuva e senti-me serena. Esta semana vai ser intensa, com muito trabalho, e, por isso, quis aproveitar o dia de ontem para restaurar os níveis de energia e estar pronta para o que der e vier. Soube-me muito bem e, acima de tudo, não me pareceu egoísmo. 

Por vezes, tendemos a considerar que tirar tempo para nós é um ato egoísta e desnecessário. Não adianta estar a investir em atividades de autocuidado se as experienciamos com culpa. O objetivo destes momentos é serem de serenidade, de nos nutrirem e nos fazerem sentir bem. Se os vivenciamos com pressão, culpa e tensão, não cumprem o seu propósito. 

Todos, sem exceção, merecemos aproveitar e desfrutar da vida. Merecemos uma pausa, por mais pequena e curta que seja, para respirar e saborear o bom que é estar vivo. É cliché e conhecida a expressão "se eu não cuidar de mim, quem cuidará?", e não é à toa. Para sermos melhores profissionais, melhores esposas/maridos/namoradas/namorados, melhores amigos, melhores filhos/pais, melhores pessoas, precisamos de investir na nossa saúde e cuidar primeiro de nós para, de seguida, conseguirmos cuidar dos nossos. 

Assim, questiono-te, o que fizeste ou farás hoje em prol do teu bem-estar?

31
Jul21

7. confessions

mar

Confesso que gosto muito de ler literatura erótica. Não me refiro única e exclusivamente a conteúdo BDSM, até porque, para ser honesta, nunca li nenhum livro que se foque neste tipo de prática. Mas sei que a maioria das pessoas tende a associar livros eróticos ao 50 shades of grey, quando, na verdade, existe todo um mundo de livros e temáticas que vão muito além dos livros da E.L. James.

O que mais gosto neste tipo de leitura é que permite elevar o romance a um outro nível, que tende a faltar nos romances típicos. Leva-nos à componente da sexualidade, da atração, do desejo, do carnal e intenso, ultrapassando o romance platónico, que gosto, mas, muitas vezes, não acho credível. Gosto de ler um romance que me arrebata, em que os protagonistas se amam, desejam e se entregam um ao outro sem reservas e pudores. Para mim a sexualidade exige vulnerabilidade, no sentido em que permitimos que o outro aceda não só ao nosso corpo, mas aos nossos desejos e fantasias, sem receio do que poderá achar, apenas confiando e entregando. Na literatura erótica, pelo menos na que leio, o sexo não é só sexo, é uma extensão do amor, é um ponto de encontro, é a expressão de confiança absoluta. Mas mesmo quando o sexo é apenas e somente sexo não se torna menos interessante, porque a sexualidade faz parte da vida e vive-la é saudável.

É certo que os romances eróticos estão cheios e carregados de fantasia, isto é, existe muita romantização e descrições irrealistas, mas que, simultaneamente, tornam os casais mais credíveis. Gosto de saber que um romance pode conter algum conteúdo erótico, mas, por vezes, creio que não faz muito sentido separar literatura romântica da literatura erótica, porque quase sempre um livro erótico tem por base o romance, uma história de amor de duas pessoas que se cruzam, conhecem e acabam por se apaixonar. 

Admito que sinto alguma vergonha em partilhar que gosto deste tipo de leitura e, embora não leia em segredo, também não comento com ninguém as minhas reviews literárias deste tipo de contéudo. Mas, quando paro para pensar no porquê desta vergonha, vejo que não faz sentido. A psicoterapeuta e terapeuta conjugal Esther Perel considera que o erotismo é uma prática de autocuidado e autoconhecimento, algo com o qual concordo a 100%. Quando leio um livro mais "picante" (odeio este termo, mas é o que temos), dou por mim a fantasiar, a desligar-me por completo o mundo à minha volta, a imaginar como seria viver aquela experiência. Não há nada mais saudável do que nos conhecermos e descobrirmos as nossas fantasias e desejos. Afinal, picante é um dos ingredientes que dá sabor à vida!

29
Jul21

3. Melofilia

mar

Durante muitos anos, considerei que rock era o meu estilo de música. Vivi uma adolescência de phones nos ouvidos, com vozes estridentes e riffs de guitarras a bombar a todas as horas. Mais do que gostar de rock, eu sentia que toda a minha personalidade se alinhava com o estilo. Era uma expressão de quem eu era: explosiva, intensa, incontrolável. Isso associado aos meus caracóis fartos e ao meu estilo calça de ganga, tshirt e all stars post mortem permitiu-me construir uma identidade. Passava horas não só a ouvir música, mas também a ler sobre música. Tinha um fascínio gigante por ler letras de músicas e estuda-las, tentar compreender os significados escondidos, as referências, as métricas. Lia igualmente sobre as histórias de vida dos músicos que admirava e sentia-me inspirada a ser eu mesma. Claro que estava a viver a adolescência pura e dura, naquela época tudo isto tinha uma importância gigantesca na minha vida e levava muito a sério as minhas convicções. Cheguei a ter discussões acesas por temas tão sérios e importantes (só que não!) como ser team Axl ou team Slash. By the way, team Axl até ao fim!

Hoje, já numa outra fase, alguns anos volvidos, percebo que sou do mais eclético que existe no que diz respeito a música. Gosto um pouco de tudo, acho que há um momento para ouvir toda a música. Aliás, há momentos que exigem, por si só, um determinado estilo de música e apenas nesse contexto só esse tipo de música faz sentido. Sim, estou a referir-me aos Dança Kuduro típicos dos casamentos, que adoro, embora não perceba nadinha daquela coreografia e vá sempre para a esquerda quando é para ir para a direita, para a frente quando é para ir para trás, e bato sempre contra toda a gente. Estou a referir-me a um bom jazz quando estou a trabalhar e apenas quero ouvir instrumentos. Um bom pop quando estou no carro, a caminho do trabalho, para cantar e espantar todos os males! Um concerto de música clássica leva-me às lágrimas, de tanta emoção que provoca em mim. O rock liberta-me e faz-me sentir corajosa e capaz de tudo. Há a música de conforto, a música que embala a tristeza, a música que nos eleva o astral (para mim, Natiruts faz isso na perfeição), a música que nos esmaga pela sua beleza, a música que nos faz abanar o capacete e faz tão bem à alma e até a música para ouvir enquanto se passa a ferro ou lava a casa de banho. 

Felizmente existe uma variedade imensa de estilos, bandas, artistas e músicas para cada momento e situação, para nos perdermos e, outras vezes, nos encontrarmos. Há espaço para tudo e todos e isso é maravilhoso.